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Juros mais baixos + Crédito mais acessível = Mais pessoas endividadas

11,08,12

Por Enio Willian da Silva

   O título dessa matéria chamou sua atenção? Imagine então o quanto ele está chamando a atenção dos especialistas e dos serviços de proteção ao crédito.

   Os brasileiros nunca viveram um cenário econômico tão positivo com relação ao crédito como estão vivendo hoje. O Brasil ainda continua com o título de países com as maiores taxas de juros reais do planeta. No entanto, ela vem caindo gradativamente ano após ano.

Os juros cada vez mais baixos

   Hoje, a taxa de juros praticada na economia brasileira, medida pela Taxa Selic, está em nível historicamente baixa. A taxa Selic é uma taxa referencial que serve como parâmetro para que as instituições financeiras e outras entidades estabeleçam suas taxas cobradas no mercado. Isso significa que quando a taxa Selic aumenta os juros cobrados pelos bancos, pelas financeiras e outras instituições também aumentam. Quando ela recua, as taxas de juros também tendem a recuar. Nunca o país viveu um cenário de juros tão baixo em toda a sua história como está vivendo em 2012. Em março de 1999, a taxa praticada era de 45% ao ano. Em março de 2003 ela registrava 26,5%. Em maio deste ano ela se encontrava a 8,5% ao ano, o menor nível da história. O gráfico 1 mostra como a taxa básica referencial de juros brasileira (definida pelo Banco Central) vem caindo nestes últimos anos. 

O crédito cada vez mais acessível

   Com juros mais baixos, milhares de brasileiros tem em mãos, agora, um crédito mais barato. No entanto, muitos ainda não conseguem utilizar esse crédito fácil de maneira adequada e consciente. Ao invés de utilizarem as modalidades de crédito com juros mais baixos para investimentos, muitos ainda utilizam as modalidades mais caras, e o pior, para o consumo. É a pior alternativa que um cidadão pode escolher.

   Com a redução da Selic, os juros praticados na economia ficam mais baratos, mas nem todos os tipos de crédito seguem a mesma tendência. Os juros praticados nos cartões de créditos e no cheque especial continuam irredutíveis, com juros muito elevados. Já os juros das outras modalidades como o crédito pessoal, crédito consignado (com desconto em folha de pagamento), financiamentos em geral e outras, tendem a acompanhar as variações da Selic.

   Em regra geral, nenhum tipo de crédito deve ser considerado ruim, desde que a pessoa o utilize de maneira responsável. Quando utilizado inadequadamente e sem planejamento, qualquer modalidade torna-se um grande vilão (veja as características das principais modalidades disponíveis no quadro 1).

Tipo de crédito disponível para pessoas físicas

Quando utilizar:

Taxa média mensal de juros cobrada (em maio de 2012)1

Quando se torna o vilão

Cartão de crédito

Para compra de produtos ou serviços parcelados sem a incidência de juros, somente quando a pessoa possui plena capacidade de pagamento da fatura total em dia.

Em situações extremamente emergenciais, quitando a dívida do cartão de crédito o mais rápido possível.

Entre 2,27% e 15,95%

O cartão de crédito se torna um vilão quando a pessoa deixa de pagar a fatura integral, ou seja, efetua somente parte do pagamento ou o pagamento mínimo determinado. Os juros cobrados na(s) fatura(s) seguinte(s) do valor ainda não pago são altíssimos.

Cheque especial

O ideal seria nunca utilizá-lo. Seu uso é tolerado (e não incentivado) em situações extremamente emergenciais, onde é necessária uma intervenção financeira rápida, onde a reserva financeira da família não é suficiente para cobrir tal eventualidade.

Em situações emergenciais que não podem esperar.

O saldo devedor deve ser quitado o mais rápido possível.

Entre 1,38% e 9,98%

Quando o saldo devedor do cheque especial não é quitado em até três dias, os juros incididos começam a crescer exponencialmente.

Quando inevitável, nunca o utilize por mais de três dias.

Crédito pessoal (inclusive o consignado)2

Em situações consideradas urgentes ou muito importantes, mas que podem esperar alguns dias, pois um empréstimo pessoal pode levar mais de 24 horas para ser aprovado.

Entre 0,79% e 5,93%

Quando utilizado para o consumo (por exemplo, para a compra de uma TV nova, de um jantar num restaurante, etc).

Aquisição de bens (veículos e bens em geral)

Para financiamento de veículos e outros bens, principalmente quando a utilização desses bens trouxerem vantagens financeiras para seus proprietários.

Entre 0,77% e 2,95%

Quando utilizados para a aquisição de bens que não trarão vantagens financeiras ou outras vantagens a seus proprietários.

Financiamento imobiliário

Para financiar imóveis em geral, principalmente quando for o primeiro imóvel.

Entre 0,71% e 0,87%

                                       Quadro 1: As modalidades de crédito disponíveis para pessoas físicas

                                       Fonte: Elaboração do autor

(1)     Taxa de juros divulgada pelos bancos e publicada no site Uol em 23 de maio de 2012. As menores taxas são concedidas para tipos específicos de clientes, de acordo com regras específicas de cada instituição financeira.
(2)     As menores taxas normalmente são destinadas em empréstimos para pessoas aposentadas pelo INSS.
 

   A contratação de qualquer uma das modalidades de crédito sem um planejamento familiar trará consequências desastrosas a seus contratantes. Fica evidente que o principal fator para que uma família não entre em dívidas, principalmente aquelas mais caras (com juros mais altos), é a elaboração de um bom planejamento financeiro. Tudo o que não foi planejado corre sérios riscos de não trazer os resultados desejados.

Cada vez mais pessoas endividadas

   Se por um lado os juros estão caindo no Brasil e o crédito ficando mais acessível e barato (e isso é bom), o endividamento da população, por sua vez, parece não seguir essa mesma tendência. Em 2011 o endividamento do brasileiro bateu recorde, segundo matéria publicada no site Estadão, e, em 2012, muitos estão utilizando até 45% da renda para pagar dívidas, segundo informações divulgadas no jornal O Globo neste ano. Para piorar a situação já ruim, muitos desses endividados não têm condições de pagar suas dívidas, conclui o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, em pesquisa divulgada em fevereiro deste ano.

Como sair dessa situação

   Para quem já está endividado, sair dessa situação pode parecer um caminho difícil, mas não é. É preciso, sim, de mudanças de comportamento, de muita disciplina e paciência.

   Mesmo com todas as melhores dicas para sair de uma situação de endividamento, é necessária uma mudança de comportamento, uma mudança na maneira de pensar e agir, para que os resultados sejam duradouros.

   Em primeiro lugar, é preciso entender que nunca se deve gastar mais do que aquilo que se ganha. Se seus gastos superam o valor de sua renda, não tente aumentar a renda contraindo empréstimos ou utilizando o cheque especial ou o cartão de crédito. Ao invés disso, reduza seus gastos.

Dívidas no cartão ou no cheque…

   Se você possui dívidas no cartão de crédito ou no cheque especial, converse com o gerente do seu banco e tente optar por um crédito mais barato. Em situações como essas é interessante contratar um empréstimo pessoal, onde as taxas de juros são menores, para quitar o saldo devedor causado pelo cartão de crédito ou pelo cheque especial que possuem taxas mais altas.

Quando as dívidas são muitas

   Se você possui várias dívidas, dê preferência para àquelas que possuem juros mais altos. Ou seja, se você realmente não tem condições de quitar todas de uma única vez, pague ou tente renegociar àquelas onde as taxas de juros embutidas são maiores. Em algumas situações (mas não em todas), torna-se viável contratar um novo empréstimo para quitar todas as suas dívidas. Dessa forma, você ficaria com apenas uma dívida  não com muitas, desde que a taxa de juros cobrada nesse novo empréstimo seja menor que as taxas incididas nas dívidas anteriores.

Mas, o ideal é…

   Por mais que existam soluções inteligentes para reverter uma situação de endividamento, o melhor remédio sempre será a prevenção. Não espere ficar doente para tomar remédios e ficar bom. Previna-se, mude seus hábitos e seu estilo de vida para que a doença não chegue e você não precise recorrer a remédios. As vezes, algumas doenças vêm mesmo nós adotando todas as precauções necessárias. Nessa situação, usa-se o medicamento mais adequado. A doença foi grave e prolongada demais, então recorre-se a intervenções mais profundas como uma internação hospitalar ou a uma cirurgia.

   Na vida financeira é a mesma coisa. Faça um bom planejamento de vida, nunca gaste mais do que aquilo que se ganha, respeite o orçamento doméstico e o planejamento financeiro, mude seus hábitos de consumo e faça uma reserva financeira suficiente para sustentar sua família por três a seis meses em caso de situações adversas. Mesmo assim, alguns imprevistos podem ocorrer. Ocorrendo-os, utilize sua reserva financeira que foi criada exatamente para essa finalidade. Reponha-a assim que a situação familiar se reestabelecer novamente. Se a reserva ainda não foi suficiente, então recorra ao crédito, sempre optando por aquele mais adequado à sua situação. Ou utilize o crédito para investir em algo que lhe traga retornos superiores aos juros que você pagaria ao obter esse crédito.

   Imprevistos ou crises podem ocorrer com qualquer pessoa ou família, para aqueles que planejam ou não, para aqueles que prezam por uma boa saúde financeira ou não. A diferença estará na maneira de lidar com eles, de como cada um passará por eles.

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